Numa foto preto-e-branca, no quadro de meu quarto, com os amores de minha vida...
E meu presente, agora, um filme francês. Tal como a foto acima.
O ser Humano? Sei lá se eu sei algo sobre o ser humano...
Pediu um wisk. Virou-o rapidamente e olhou-a novamente, naquele café logo ao lado. Seguiu em passos firmes, que se fosse comedido sairia correndo. O medo do encontro. Como ela estava de costas, acabou não vendo-o.
- Martha Verônica.
Virou-se rapidamente, como se o tom de voz não tivesse mudado nada, como que adivinhando o som do cheiro antigo. Sorriu um sorriso largo, bonito, ligeiramente amarelo.
- ... Pedro Nunes...
Levantou, ficou sem onde por as mãos.
Ele abraçou-a, beijo no rosto, como que tentando quebrar um gelo possível.
- Quantos anos, moça...!
- Sim, desde anos... Você estava vindo pra cá...
- E cá estou desde então.
- E bem que você disse que não sabia quanto tempo ficaria, se dois meses ou dois anos.
- E já estou a 10 anos.
- Tive notícias suas, de jornais, artigos... Parece que você conseguiu o que queria aqui... Disse, aumentando o sorriso, amarelíssimo...
- Não.
- Como não?
- Saí de meu país para fugir de você. E você esteve sempre presente.
Abraçaram-se. Um abraço apertado. Os dois com um choro, choro pequeno. E, como que por desespero mútuo, beijaram-se...
Já eram anos, estava em meados dos 30 vividos, quase uma década fora e menos calvo do que todos esperavam. Tinha ganhado um pouquinho de dinheiro, um certo reconhecimento e vários lugares onde pagavam para dizer obviedades. Conversava com muitos dos antigos através das maravilhas da tecnologia.
Escreveu dois livros, dezenas de artigos e escutava todas as músicas tradicionais de onde veio. Aprendeu duas línguas além da sua e lia bem em outras duas. Produziu programas de tv, rádio e escrevia como comentarista regularmente em dois jornais brasileiros, um inglês e três de algum outro país latino. Era conhecido como um professor acessível, não lá tão sério e rigoroso, mas odiado por várias críticas feitas a todos, que sua arte sempre foi criticar; e respeitado por muitos daqueles que sempre se calam.
E então que, andando por uma daquelas ruas cheias de turistas, viu o espectro do passado num daqueles cafés de cidade badalada. Pegou o celular, desmarcou o compromisso, sentou, observou. Somente observou, que toda coragem é pouca para enfrentar metade de seus anos de distância.
E nenhum daqueles pensadores conhecidos o ajudaria na insegurança, que já há anos, percebeu que não mudaria. De certa maneira não se aprende a viver, que ele nem pensou que, naquela mesa, a pessoa também pensava os anos, assim como anos pensando em como poderia ter sido diferente.